Em todas as épocas houve uma expectativa social em relação à escola, e ao lermos os pensamentos de homens públicos e intelectuais brasileiros do passado recente ou não, nos surpreendemos com a atualidade de seus dizeres, o que nos leva a crer que a escola raramente atendeu a estas expectativas. E o mais curioso, ainda, é que através dos tempos, a escola se manteve estável em seus conteúdos básicos, na seqüência escolar dividida em anos letivos, na organização das séries escolares anuais como unidades básicas da escola, na estrutura disciplinar e na hierarquia centrada na visão personalista de poder, na organização individual do trabalho de professores/as e em diversos outros aspectos que parecem 'naturais' à instituição escolar.
Ao trazer para a reflexão dos docentes os princípios pedagógicos
da interdisciplinaridade e da contextualização, da autonomia,
da diversidade e da identidade, previstos nas Diretrizes Curriculares
Nacionais, colocamo-los diante de formas diferentes de considerar o conhecimento,
a aprendizagem e o ensino. O que fundamenta tais formas são a complexidade
genérica do conhecimento humano, a complexidade da realidade(1).
O investimento que um/a professor/a faz (ou deixa de fazer) em relação
ao aprimoramento de sua ação docente deriva de uma concepção
de formação profissional pessoal produzida por suas experiências
em instituições de formação de professores,
em cursos de atualização, leituras, convivência com
as diferentes linguagens da arte, etc e, principalmente, com sua percepção
do papel social da escola e de sua profissão.
É preciso que os/as professor/as reconheçam nas crianças
e jovens a capacidade de conhecimento espontâneo, intuitivo, experimental,
conhecimento cotidiano, do tipo revelado pelo aluno ou pela aluna que
sabe fazer troco, mas não sabe somar os números (Shon, 1992).
Significa entender a realidade social ou da natureza em sua complexidade,
em seus contextos situacionais e permitir-se a perplexidade e a surpresa
diante dos mundos possíveis (Bruner, 1997). É saber que
a sua resposta não é a única correta, a única
possível(2).
A troca com o saber dos/as alunos/as, repetidamente anunciado nas propostas
e fazeres docentes se realiza, na verdade, quando os docentes desenvolvem
sua acuidade para descobrir as razões que levam aqueles e aquelas
que aprendem, a saber, e dizer certas coisas.
É acolher, ir em direção das crianças e dos
adolescentes e caminhar com eles e elas na articulação entre
o que sabem pela ação e o saber escolar. É ser um
professor que desenvolve a reflexão na ação e sobre
a ação docente (Shön, 1992) e, assim, se sentir impelido
a sair de seu isolamento e tentar algo novo.
À medida que os professores forem desenvolvendo a capacidade reflexiva
no desenvolvimento profissional – daí a necessidade de se
dispor a buscar e usufruir as oportunidades de formação
contínua, de vivências novas –, na luta pela dignidade
social e econômica, no reconhecimento das deficiências científicas
e da pobreza conceptual dos programas atuais de formação
(Nóvoa, 1992: 23), na admissão da capacidade de reelaboração
das propostas ou diretrizes emanadas da política educacional, vão
se tornando profissionais, na acepção da palavra, no exercício
da profissão docente. E mais, no dizer de Monica Gather Thurler,
a escola torna-se uma organização aprendente, de reflexão–ação
coletiva.
Para que a escola mude, é necessário que professores e professoras
mudem sua forma de ser professor e professora, ao integrar à sua
prática docente os resultados de pesquisas nos campos da epistemologia
e do currículo, da psicologia e das relações entre
ensino-aprendizagem que possibilitam novas formas de conhecimento, ensino
e aprendizagem. A expansão do desenvolvimento profissional se realiza
a partir do que cada docente já faz, da observação
e reflexão sobre sua prática, da troca de experiências
das quais possa extrair novos conhecimentos.
Este texto está contido no artigo Profissional da Educação:
Modelos e Referências, do terceiro fascículo, entre os seis
que acompanham a Série Professor Profissional composta de trinta
e seis programas de vídeo de15 a 18 minutos. A Série de
vídeos e os fascículos que os acompanham foram produzidos
para os professores que participam do Segundo Ciclo de Estudos promovido
pela Fundação Darcy Ribeiro em convênio com a Secretaria
de Estado de Educação do Rio de Janeiro, durante o ano de
2002.
A Série é dirigida para o professor, como categoria
profissional. Trata de como se dá o exercício da profissão,
em vários de seus aspectos. Mais é também dirigido
para cada um de nós, cidadão brasileiro. Que pensamos e
o que esperamos da escola e dos professores e das professoras? Este artigo
é a expressão de uma corrente de pensamento. Depois de ler,
escreva sua opinião, o que pensa e quais são suas expectativas
da escola pública e do professor ou professora.
(1) Sobre tais fundamentos, ver LUCK, Heloísa (2000) Congresso
Internacional de Educação / Livro do Congresso. Rio de Janeiro,
SME e MORIN, Edgar (1999) A Cabeça bem feita. São Paulo,
Cortez.
(2) Sobre essas questões, ver Programas Interdisciplinaridade,
Arte e Ciência e Temas Transversais, da Série Professor Profissional
(FUNDAR, 2002) e Aprendizagem Significativa, da Série Rede Geral
(Secretaria Extraordinária de Programas Especiais, 1994, reeditado
pela FUNDAR, em 2001).
(Fundação Darcy Ribeiro)
Link: http://www.fundar.org.br/temas/texto__3.htm - acesso em 27/02/2013 às 13:56
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